mocinha XXIII

quer vinho?
vem, violão!

devoradora de almas

bem, eu a encontrei no milharal
numa dessas encruzilhadas da vida
sentada, colorida e florida
toda bela, ela era a tal

conversamos bobagens por horas
então subiu pra cabeça a fumaça
eu não sabia que seria a desgraça
não sabia que minh'alma ia embora

então ela me fez falar coisas
que eu não queria falar
então ela me fez brincar com coisas
com que eu não queria brincar

devoradora de almas
sugou meu coração
tirou minha razão
me roubou a calma

serpenteando sedutora
caminhamos até a floresta
acordou em mim a fera
com belas palavras de sua boca

segredos da noite ela guardou
eu cooperei como um babaca
quando mais uma vez a facada
sacou, furou, afundou, girou...

au revoir

você diz que me ama
que sente minha falta
faltam meus olhos, minha risada,
nossos papos de madrugada
falta minha pose de durão
diz que fico mais bonito canastrão...

diz que eu fico de papo
porque sou fraco...

negativo,
pois,
e aqui justifico:

a decisão,
meu anjo,
está em tuas mãos...

a despedida,
meu amor,
se sela segunda...

a saideira,
honey,
já desceu ladeira...

au revoir,
mon cher',
o passarinho quer (e vai) voar...

mocinha XXII

é uma bolota de mirabel
doce e viciante que nem mel...

amanditas

rosas são vermelhas,
violetas são azuis.
o amor que por ti sinto
é uma palavra que poderia rimar com luz...

mas não quero
não quero fazer desse amor nobre
uma rima pobre

as palavras perdem sentido,
quando o que importa é o teu sim...
os sons se tornam um balbuciar sem fim,
quando me interessa é o teu sim...
os pontos, os dois pontos, a vírgula,
a exclamação, a interrogação, o ponto-e-vírgula,
toda uma sintaxe
fica sem taxe
quando eu só quero ouvir o teu sim...

e a vida é assim...
se você disser sim,
aí sim!
e se não disser?
aí é o fim

e continuo a vida remando
na poesia rimando
rosas vermelhas e violetas azuis,
com o amor que por ti sinto é energia que me conduz...

passions

"paixão é quando a gente veste uma blusa
só porque ela combina com teus olhos cor de chuva...

e lá vai você...
tão lindo de vermelho,
de longe, depressa...

não era pra você me ver,
era só pra eu te olhar."

paixão é uma coisa que, não importa a blusa,
é maquiagem e, meu bem, ela sai com chuva...

e lá estava você...
tão apaixonada de azul ou verde,
de longe, esparramada...

que bom que você me viu,
pois talvez só assim você vai entender que eu não quero paixão.

quero ser amado.

diga-me com quem andas...

e Freud te dirá o que farás:

neurótico? a obsessão te cegará...
psicótico? a verdade esconderás...
perverso? o mal praticarás...

e Aristóteles te dirá quem és:

mentiroso? mentirosa és...
enrolador? enroladora és...
falso? falsa és...

e a moral católica te julgará:

infiél? pela infidelidade pagarás...
traidor? dificuldade de dormir terás...
judas? cuidado, pois no inferno poderás queimar.

deletério

tomando sorvete na praça
vi um andarilho se mexer,
em plena tarde de vadiagens,
no reflexo da colher...

olhand' atentamente a desgraça
era um maltrapilho a colher,
na lixeira de grades, bobagens.
o deletério assim é...

vai sumir

eu sei que você te sente chateada
eu sei o que se passa nessa tua cabecinha
nesse teu coraçãozinho

eu sei que tu já foste minha amada
eu sei o que me disseste com tua vozinha
nessa minha orelhinha

mas chega...
chega de desrespeito
chega de desafeto
chega de desilusão
chega de desalegria

chega...
eu não mereço
você não merece
e se insistirmos em continuar insistindo

é o amor que vai
aos pouquinhos
sumindo...
sumind...
sumin...
sum...
ssss.....

...

...

moçambicana

o papel dourado
que ali estava,
envolvendo,

e eu revoltado
aqui salivava,
tremendo,

não podia tocar,
saborear ou cheirar,
apenas ver...

só me cabia olhar,
imaginar e pensar,
uma pena: não ter...

e eu imaginava:
o chocolate ao leite
e, para meu deleite,
uma cesta amarela,
numa mesa azul.
uma preta tão bela,
um branco de olho azul.
ela veio de outras terras,
eu, da zona sul.
ela me envolver com as pernas,
eu, me entregar ao nu...